Hoje, após enfrentar o sol quente do meio-dia e receber vários "não", consegui apurar informações suficientes para fazer metade da minha reportagem sobre o comércio ambulante na Avenida Conde da Boa Vista. Além de não ter o perfil de uma grande (né?) repórter, minha pauta exigia conversar com pessoas que vivem desconfiadas por conta do caráter ilegal da atividade — o comércio ambulante é proibido em toda a extensão da avenida citada e o comerciante está sujeito à punição ou à apreensão do seu material. Assim, minha missão foi um tanto difícil, mas não impossível. Com o meu caderninho tímido de estudante de jornalismo, fui à avenida sem medo. Contando apenas com a companhia da minha caneta Bic, tentei entrevistar, em vão, vários vendedores. O primeiro que abordei, um vendedor de falsos perfumes da Boticário, disse que as mercadorias não pertenciam a ele e apontou para o suposto dono, que devolveu a responsabilidade dos produtos para o outro cara. Logo desisti de ficar de "moleque de recado" e fui em busca de outras pessoas. Assim, encontrei uma mulher, identificada somente como Mônica, que vendia óculos de sol. Ela dizia não saber muito coisa sobre sua atividade, pois o dono mesmo era o marido. Por outro lado, Duda (tudo o que sei sobre ele), o marido, disse, de pronto, que não responderia nada. Dessa forma, ficou impossível conseguir alguma informação. Resolvi , portanto, conversar com outra vendedora de óculos metros adiante. Miriam foi bastante simpática e, junto com o seu marido, contou-me bastante coisa. Foi possível, inclusive, pegar o depoimento de uma cliente dela, que, na pechincha, levou um óculos da "Kevin Klain" por dez reais (custava 13). Enquanto conversava com esse casal, avistei um vendedor de DVDs piratas que acabava de montar seu tabuleiro, então, assim que terminei a entrevista na barraca dos óculos, fui conversar com ele. Sem qualquer simpatia, disse que estava ocupado. Insisti assim mesmo e, em seguida, arrependi-me. Na minha primeira pergunta, o cara mandou um: "Você não bota DVD, você bota brinquedo. DVD é ilegal". Fiz mais algumas perguntas e fui embora, claro. Não adiantava explicar, ele não me incitava a mentir. Segui adiante, meio cabisbaixa por não ter conseguido grandes coisas, eis que ouço "40 'nego-bom' é um real" e resolvo parar. Ainda titubeei, é verdade, mas não demorei a abordar a dona do bordão. Ela disse que conversaria comigo, mas que antes iria beber água. Fiquei esperando e quase fui embora por não acreditar que ela voltaria. Sempre desconfio dessas histórias de "vou ali e já volto". Ela demorou um pouco, mas manteve a palavra e voltou cheia de vontade de falar. Conversamos durante bastante tempo, o que me rendeu boas informações. Entre uma pergunta e outra, ela não deixava de gritar "40 'nego-bom' é um real". Quase que eu compro, mesmo sem gostar do doce. Em seguida, caminhei até o Shopping Boa Vista para encontrar as demais integrantes do grupo de reportagens sobre A Avenida Conde da Boa Vista. Elas tinham chegado há pouco tempo, mas logo se movimentaram para entrevistar as pessoas. Éramos quatro garotas, cada uma com uma pauta diferente sobre a mesma avenida. Eu resolvi dar uma parada na minha apuração, estava cansada, nem tinha almoçado. Então, fiquei, basicamente, acompanhando elas e tirando algumas fotos para a minha reportagem. Resolvi parar, contudo, quando avistei uns hippies vendendo brincos e afins. Recordei-me de um dia, ano passado, em que sentei, com uma amiga, para conversar com eles naquele mesmo lugar. Eles haviam sido bastante simpáticos naquela ocasião. Hoje, no entanto, meu papo não conquistou a simpatia deles. Ao dizer que estava fazendo uma reportagem sobre pessoas que realizam comércio naquela avenida, levei um super fora: "Então vá falar com eles ali, nós somos artesãos!". Tentei explicar um pouco, mas não cativei, só me restou ir embora mesmo. Desisti de vez de entrevistar mais gente e fiquei só acompanhando as demais integrantes do grupo. No cruzamento da Rua Sete de Setembro, demos uma parada, porque uma das meninas estava colhendo o depoimento de um taxista acerca da obra do Corredor Leste-Oeste. Assim, o resto do grupo ficou na esquina esperando, inclusive eu. Estávamos conversando e, de repente, ouço um grito. Sem que ninguém visse qualquer coisa, um sujeito furtou o colar (de prata) de uma das companheiras que estavam do meu lado. Foi tudo muito rápido, quando fui olhar, o cara já estava há mais de cinco metros de distância e as pessoas ao redor também não tinham entendido o que havia ocorrido. Um momento de tensão tomou conta do grupo. A garota furtada chorava de raiva e de tristeza, pois o colar era um presente da avó, enquanto as demais estavam assustadas. Vale citar que isso foi em frente a um posto policial, algo que, sinceramente, não me surpreende, mas não deixa de ser "irônico". Depois desse fato, metade do grupo resolveu ir embora e a outra metade ficou na avenida. Eu resolvi permanecer para entrevistar mais gente e fazer companhia para a outra integrante que não tinha conseguido apurar muita coisa. No fim das contas, não entrevistei mais ninguém. Metros e metros de caminhada e entrevistas deixaram-nos com fome. Resolvemos dar as atividades por encerradas e ir almoçar, já eram mais de 15h. Fomos ao shopping e dividimos uma pizza grande. Durante o almoço, conversamos bastante sobre questões extra-trabalho. O papo estava tão interessante que, distraídas, esquecemos de pagar a conta e saimos da praça de alimentação. Tempos depois, quando já estávamos indo embora, lembrei-me desse "detalhe" e voltamos para o restaurante. Ao chegar no lugar, percebemos o clima tenso. Os funcionários estavam reunidos e o gerente parecia discutir com a garçonete. Apressamos o passo e esclarecemos tudo. A expressão de felicidade da garçonete ao nos ver foi tão incrível. Os demais funcionários olhavam-nos com expressão de surpresa, como se dissessem "nossa! elas voltaram". Então, finalmente, pagamos a conta e fomos embora. Enfim. Vou dormir porque amanhã terei que enfrentar o sol do meio-dia na Avenida Conde da Boa Vista de novo.