terça-feira, 9 de junho de 2009

Ilumina-os

Comecinho de noite, a luz apaga-se e todos ficam no escuro. Sempre se encontram na labuta, sem tempo para delongas, e naquele dia, naquela noite escura, trancados numa sala, a ausência de luz obrigou-lhes a conversar. Por vezes tímidos, por vezes ocupados, só falavam tão-somente o estritamente necessário para uma convivência razoável. Então, cessar o silêncio noturno daquela segunda-feira escura, debandou tempo. Minutos que se estenderam por horas, sem ninguém balbuciar uma única palavra. Naquele momento, percebeu-se a falta de qualquer intimidade entre aquelas pessoas que se encontram todo dia no mesmo lugar, no mesmo horário. A rotina atribulada não foi capaz de forçar a troca de segredos, nem mesmo o diálogo sobre coisas triviais do cotidiano. Em meio a todo o estresse do turbilhão de informações diárias, falar sobre uma dor de cabeça, o fim de um relacionamento, uma doença na família, era quase impossível. O tempo passava, a luz não vinha, aquela sala ficava cada vez mais apertada. Cada passo do ponteiro do relógio obrigava aquelas pessoas, que mal se olhavam, conversar, ainda que sem se verem. As expressões do rosto de cada um ficavam escondidas na penumbra dos feixes de luzes dos celulares. Volta e meia alguém tomava para si a responsabilidade de forçar um diálogo que instantaneamente findava-se, pela grande vontade que cada um estava de fugir daquele ambiente. As conversas davam-se num constante cenóide, em que cada silêncio evidenciava a falta de assunto. O tempo demorava a passar como se quisesse provocar aquelas pessoas, como se desejasse obrigá-las a falar, ainda que sobre a demora do conserto do poste, talvez único assunto que tinham em comum. Quando não havia mais palavras, quando se cessaram todos os diálogos, cansados de esperar, enfadados daquela situação quase claustrofóbica, todos, num uníssono, propuseram o retorno de cada um às suas respectivas casas. Deu-se a alforria.

2 comentários:

rodrigo martins disse...

isso tem cara de quinta-feira. só que bem menos divertido!

Girabela disse...

Qualquer semelhança é mera inspiração.

Abraços,
Gabriela.