terça-feira, 15 de abril de 2008

Oscilando entre a "ficção" e a realidade

O seguinte texto versa sobre o filme, The Pervert's Guide to Cinema (2006), e tenta sistematizar os principais nexos lógicos que norteiam a trama. O autor promove uma discussão sobre grandes obras do cinema mundial, contrapondo-as as teorias da psicanálise. Realiza um debate de um lado enfatizando o que determinados filmes dizem sobre a construção das fantasias (ficção/realidade) humanas e por outro lado, como a psicanálise interpreta tais fenômenos. O meu intuito foi delinear os principais pontos de argumentação e tentar, na medida do possível, incrementar o debate com alguns conceitos sociológicos mesmo que de maneira rudimentar. Enfim, abaixo você encontrará algumas divagações próprias do Zizek e algumas oscilações da realidade minhas.

Slavoj Zizek é um filósofo lacaniano-marxista de Ljubliana, capital da Eslovênia. Tem escrito livros com temáticas com o cinema de Hitchcock, Lênin, a ópera, e os ataques terroristas de 11 de setembro. A meta da obra de Zizek é combinar a crítica marxista do capitalismo com informes psicanalíticos para desmascarar a forma que opera o capitalismo sobre a imaginação pública. Em 1990, Slavoj Zizek foi candidato a presidência da República da Eslovênia nas primeiras eleições democráticas do país.

Obs.: o título foi um "plágio" daquele encontrado no próprio blog - Oscilando entre a divagação e a realidade. Achei-o adequado ao propósito da empreitada e só adeqüei às minhas necessidades.

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O problema a ser considerado aqui, não é responder se nossos desejos são saciados ou não! No entanto, é saber o que desejamos. Não há nada de espontâneo no desejo humano. Os desejos são artificiais (construto social), e devemos, portanto, aprender a desejar.

O cinema é assim a arte pervertida por excelência. Ele não te dá aquilo que deseja, mas sim te diz como desejar.

Imagine uma cena onde diante dos seus olhos, uma atriz qualquer, vê vislumbrada os bastidores do que ocorre nos vagões de um trem. Observação, o trem continua em seu percurso, e é como se numa brecha do espaço-tempo, ela (atriz) permanecesse inerte e atenta a todos os movimentos dos vagões. Porém, mesmo diante de seus olhos, ela não pode interferir, pois é apenas um indivíduo passivo no processo construtivo da relação. Fazendo assim uma analogia ao que ocorre na relação direta entre espectador e a arte cinematográfica. Por fim, quando um rapaz que está em um dos vagões, oferece-lhe uma taça de bebida, é como se o filme - o macro - oferecesse a ela algo possível e acessível ao desejo. (1931 - Possuída (Possessed))

Uma visão crítica lembra-nos que a realidade não se restringe aos momentos vividos. A realidade social é bem mais complexa do que nossos momentos particulares. Várias ações pretendidas ou não-pretendidas reunem-se num processo de síntese para a realidade tornar-se completa. A realidade é mostrada frente a frente à ficção. O autor defende que dentro da própria realidade há um quê de ficção. E o essencial está não em descartar a ficção, mas perceber a realidade que há dentro da ficção.

Numa análise psicológica, ele defende que procedimentos traumáticos, violentos ou que possuam gozo em demasia, produzem resultados internos que rompem com as "coordenadas da realidade". E que posteriormente são transformadas em processos intrinsecamente repletos de elementos da ficção.

No filme Os Pássaros (1963), a ação e o ataque dos pássaros nada mais é do que a interferência da estrutura social no âmbito particular. O filme retrata uma relação típica do complexo de Édipo mal resolvido. Tal realidade é interrompida pela chegada de um outrem que rompe com os valores compartilhados anteriormente. Esse problema relacionado à normatização da ordem social - como as estruturas sociais se mantêm - tem sido o mote de muitos trabalhos nas ciências sociais. (a internalização das normas sociais)

Ele analisa o fenômeno como sendo "a explosão do superego materno". Isso seria numa ótica da psicologia. Numa perspectiva sociológica, o fenômeno poderia ser interpretado como um processo de não-internalização das regras sociais ao longo do processo de socialização primária. O que culminaria em termos durkheimianos-parsonianos numa "anomia social". Tendo como conseqüências, os sentimentos de culpa ou como se a sociedade estivesse "esmagando" sua cabeça.

Análise e caracterização dos sistemas de personalidade.

O alvo do estudo é o filme Psicose (1960) e a problematização deriva da distribuição espacial onde se desenrola a trama. Os níveis da psiquê estariam localizados da seguinte maneira, 1) o térreo seria o ego - o ambiente da normalidade, onde se respeita os padrões de comportamento social; 2) no primeiro andar encontra-se o superego maternal; e 3) no sótão temos o id. A relação entre o superego e o id é direta. O superego é uma entidade "obscena" que nos influencia com ordens impossíveis. Características fundamentais, 1) o superego é hiperativo; 2) o ego é racional, egoísta e calcula suas ações todo o tempo; e 3) o id é misterioso, porém, ao mesmo tempo que é infantil e inocente tem um mal intrínseco.

O controle das interações face-a-face

A voz representaria a dimensão da possibilidade de controle das reações dos outros indivíduos. (Se possível, ler algo sobre o sociólogo canadense, Erving Goffman). Aqui, ele trata dos "objetos parciais" e autônomos. Explica que tais atitudes, em relação aos “objetos parciais” não são exteriores à sua "natureza". Elas, na verdade, fazem parte da sua personalidade. Se você esquece a dimensão que ao mesmo tempo que ouve pode ver a cena em um filme. E parte para uma dimensão onde apenas o sentido da audição é possível, a imaginação decorre daquilo que você mesmo imagina que faria e não o que realmente acontece. Pois o que se passa não é necessariamente aquilo que você imagina, mas você imagina porque gostaria que passasse como você quer.

Por que precisamos do suplemento virtual da fantasia? O inconsciente - os desejos gerados no inconsciente geram culpa. A fantasia é produto do inconsciente, e como tal é um sonho. Quando a fantasia é realizada o que vem em mente é um sentimento de pesadelo. Em relacionamentos desta magnitude, o que vale e o que está em jogo são as circunstancias e o meio físico, não a outra pessoa em si.

Não existem emoções pré-determinadas. Todas elas, com exceção da ansiedade, como dita Freud, são construídas. Poderia então o cinema proporcionar a emoção da ansiedade? Para Zizek, o cinema é a arte das aparências. Ele nos diz algo sobre a realidade. Nos fala como se constitui a realidade. A realidade é constituída de maneira fetichista. Ou seja, determinados objetos encarnam significados que não necessariamente pertencem a eles. Em certas cenas, sabemos o que vai acontecer, no entanto, não ficamos menos surpresos quando os fatos ocorrem. Mesmo assim, o problema não se encontra no fato de não levarmos a sério aquilo que é apenas uma ficção. Mas é o contrário, o engano está em não levar a ficção em consideração. Ele cita o exemplo de indivíduos que escolhem em um jogo personagens para atuar. Dentre varias opções, o ator seleciona aqueles com características sádicas, ou estupradores, ou qualquer outra coisa. Na verdade, esse sujeito supre suas necessidades internas de maneira a minimizar suas carências reais, adotando características no jogo de uma pessoa forte e promiscua que representa uma auto-imagem falsa sua. Esta é a leitura ingênua. A interpretação mais rebuscada mostra que essa imagem falsa adotada representa o próprio "eu" do indivíduo. E que na vida real devido as sanções e normatizações sociais, não se pode deliberadamente liberá-las. Precisamos de uma ficção para mostrar aquilo que realmente somos.

17 comentários:

Anônimo disse...

Experimente CineDica.

Santiago. disse...

n entendi o seu comentário... pode dizr do q se trata o site? o nome é sugestivo, mas...

Girabela disse...

"Não há nada de espontâneo no desejo humano." Não entendi bem essa frase.
Olha, gostei do texto, e do fato de você ter citado nomes que eu preciso pesquisar, como Freud e Goffman.
Esse teu jeito cinematográfico é novo, tás muito artista, queres roubar meu cac, é? ajsdhkjasd
beijo.

Santiago. disse...

Oi Gabi...

o q o Zizek qria dizr, e q eu compartilho com ele, é q os indivíduos têm seus desejos e vontandes contruidas socialmente. Ou seja, todo discurso q tenta transformar "os homens" em apenas ser biológico ou repleto por instintos está falseando a verdadeira realidade. Pois, a normas e regras q regem as relações são construtos sociais. É cm comento posteriormente: Os desejos são artificiais (construto social), e devemos, portanto, aprender a desejar. ok?

Jeito cinematográfico é? rsrsrs Qro n, qro ficar no cfch msmo!!

abração!

Rodrigo Almeida disse...

Quando vi o comentário do anônimo, fiquei meio constrangido de também escrever, porque meu comentário também inclui a recomendação de um link. Mas lógico que não ia deixar de escrever por causa disso. É que quando li o seu texto ou mesmo antes, quando vi sobre o que se tratava, lembrei de um outro texto sobre o mesmo filme(ou melhor, a partir do mesmo filme). Só pra constar: entrei aqui através de um comentário da Gabriela num post do blog da copa paulo francis. E fiquei surpreso do último post ser justamente sobre o Zizek.

Enfim... esse outro texto sobre / a partir 'the pervert's guide of cinema' está publicado num blog/site coletivo chamado Dissenso. O texto nem foi escrito por mim (apesar de eu tb fazer parte do blog e ter sido até o idealizador dele), mas acho que, de repente você pode se interessar por esse compartilhamento de objeto inicial. Ambos, você e o André (autor do outro texto), refletem o pensamento de Zizek e suas apropriações / aplicações teóricas dentro dos filmes. Acho que você o faz ainda mais ostensivamente em termos do pensamento do teórico, quase como um resumo mesmo de suas idéias e conceitos.

O texto de André tem um direcionamento que, em dado momento, deixa de lado 'uma análise do filme ou um resgate do pensamento de zizek' para tomar um rumo próprio. Esse rumo toca uma experiência pessoal dele com 'A Estrada Perdida', de David Lynch e traz para discussão a própria noção de experiência diante de obras de arte, entre o sentimento e a razão. Por isso, coloquei 'a partir' lá em cima, porque o foco não é necessariamente o filme. O filme é objeto e também apenas um mote. Fica o convite... e o link.

Abraço

Rodrigo Almeida disse...

E uma correção no meu comentário anterior: the pervert's guide TO cinema. :)

Santiago. disse...

Olá Rodrigo Almeida (por sinal meu xará), acho que o "problema" não é recomendar um link, é na verdade, recomendar e não explicar porque diabos está recomendando. No mais, pode recomendar o que quiser.

Em relação ao seu comentário, gostaria de ressaltar que a minha tentativa como deixo explícito, logo na primeira parte do meu texto, é a tentativa, mesmo que rudimentar, de dar uma contribuição aos argumentos do Zizek. Visto que, percebo uma excessiva utilização de conceitos da psicanálise sem, no entanto, um maior esforço de relacioná-los ao contexto social.

Mas também, talvez, acredito eu, que esse não era o foco principal do seu trabalho. Digamos assim, fazer uma síntese da psicologia à sociologia e vice-versa. Talvez essa coisa de relacionar e interpretar seu trabalho por uma ótica das Ciências Sociais seja uma forma "compulsiva" que os alunos da área possuem de serem críticos, na tentativa de desmistificar algumas "verdades" cristalizadas como naturais.

Só um parênteses, até os pressuposto clássicos da formação da personalidade, hoje, são rebatidos. De forma clássica, Freud cunha a psique como se ela sempre existisse independentemente da sua relação temporal e do contexto social. Um cara como Norbert Elias irá justamente criticar esses pressuposto a partir da relação tempo/contexto. Ou seja, a análise “mais apropriada”, seria aquela que tentasse traçar a formação da psique dos indivíduos a partir do processo particular da sua socialização e do contexto social em que está imbuído.

Então, o fato de usar conceitos da psicanálise apenas, "prejudica" digamos assim, o conjunto da realidade que não é una e indivisível. Agora, claro que o filme do Zizek é bem interessante, e dá muitos insights legais para pensar - de forma, não sei se propósital, ou não - a relação sociedade/indivíduo a partir da visão cinematográfica e de uma interpretação marxista/lacaniana.

Por fim, vou dar uma olhada no link sugerido por você, e se estiver na minha "ossada" e dentro da minha capacidade de reflexão, tentarei fazer um comentário.

Abraço.

Santiago. disse...

*Um cara como Norbert Elias irá justamente criticar esses pressupostoS a partir da relação tempo/contexto.

Anônimo disse...

Hello. This post is likeable, and your blog is very interesting, congratulations :-). I will add in my blogroll =). If possible gives a last there on my blog, it is about the MP3 e MP4, I hope you enjoy. The address is http://mp3-mp4-brasil.blogspot.com. A hug.

Santiago. disse...

amigo, n sei cm vc entendeu o q está escrito no blog. visto q seu comentário está em inglês... mas tudo bem, volte sempre.

abraço.

Girabela disse...

akjaslkdjaslkdjlkasd.
Rodrigo é muito engraçado.
beijo na peruca.
aaah, valeu por me dar o filme, verei assim que puder.

Rodrigo Almeida disse...

Hmmm... só para constar: eu concordo totalmente com a fundamentação do Norbert Elias (acho que até já escrevi sobre isso). Por sinal, não conhecia esse pensador, mas claramente já tinha dentro de mim as suas idéias quase como, digamos, 'um espírito do meu tempo'. Isso provavelmente por influência de outros teóricos e não-teóricos que resgataram o Elias implicitamente ou explicitamente em suas obras. Foi ele quem desenvolveu primeiro essa teoria? Acho engraçada essa sensação de não conhecer certos autores que, de alguma maneira, estão diluídos em nosso pensamento.

E por que sou engraçado? o_O hahaha

Santiago. disse...

é, essa história de pensar algo q depois damos conta de q uma outra pessoa já teorizou sobre, acontece comigo tb. mas isso é a ciência, a produção se dá em cima daquilo q já existe.. no mais, qnd pensamos q sabemos algo, só n pensamos de maneira sistêmica..

escrevi lá no link q vc recomendou...

e n é qrndo tirar a sua graça n, ou melhor, n é dizndo q vc n é engraçado, mas acho q gabi tava falando de mim.. afinal de contas tb sou rodrigo.. :D manifeste-se gabi!

Girabela disse...

ops ops, é, foi sim, foi pro rodrigo santiago. quanto ao rodrigo almeida, creio que "conheço" de "relance" apenas, quando fui barrada de entrar no habbib's pelo tardar da hora.
prazer, almeida.
abraço,
bezerra.

asadebaratatorta disse...

haeiuhaeiuhaieh

que polêmica, hein? até em inglês comentaram, rapaz. =P
tô atrasado, então vou só passar de leve por aqui:
Qual a atualidade de Freud para se pensar o que a psicanálise chama de "desejos"?
Como explicar o momento catártico que o cinema pode proporcionar sem correr o risco de fazer uma leitura naturalista e generalizante da psiquê humana?


O texto ficou bem interessante, meu velho. ^^
Parabéns.

Um abraço^^

Santiago. disse...

boas indagações...

serei bem senso-comum! acredito q o autor desvesse estar se referindo ao caso de em filmes, onde msmo sabndo q n se passa de ficção, temos emoções a respeito dele.
a comparação dele é explicar esse fenômeno com as sociedades modernas de consumo... onde cm inicio o texto, devemos "(...)saber o que desejamos. Não há nada de espontâneo no desejo humano. Os desejos são artificiais (construto social), e devemos, portanto, aprender a desejar." acredito q vc tb concorde com isso. Pronto, a partir desse pressuposto, ele parte p a jornada lacaniana-marxista dele. Freud é usado de maneira bem "supercial". Ele n sustenta sua análise nele, mas cm nós das C. Sociais citamos: os três porquinhos, essa galera de outras ciencias tb citam seus "pais fundadores".

obs.: gostei do termo "Catarse". Aristóteles está feliz por vc!

abraço..

Dio disse...

Eu sou meio pé atrás em afirmar como construção social qualquer coisa relacionada ao ser humano. Afinal, acredito que em algum momento da "história" a sociedade foi formada. E antes? Não existia (a exemplo e resgate) desejo? Seriam vontades? Há diferenças? Me pergunto se os "desejos", no sentido que talvez se tem hoje (e considerando que seja diferente de "necessidade fisiológica") poderia ser entendido como um pastiche das vontades do nosso corpo. E até sendo um pouco radical, poderia ser uma verdadeira paródia dessas vontades, mais uma "pateticidade" do ser humano, na tentativa, sempre, de (l)imitar o real.

E aí até pode-se sugerir o debate real x ficção. Até que ponto vemos o real? Quando se fala em realidades ("o que parece bom pra você, pode não parecer pra mim") não é o mesmo que falar em ficção? Afinal, realidade e verdade não são sinonímias?

Ficam as indagações. Ah, e parabéns pelo texto, Rodrigo. Assim que eu ver o filme eu escrevo algo melhor aqui.

Abraços,
Diogo.