quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Ontem.

Ontem, fui ver uma mostra (gratuita) de documentários em prol da justiça global, na Fundação Joaquim Nabuco. Assisti a apenas um dos documentários (são dois por dia) que versava sobre o impacto da indústria do medo, tratando também do monopólio e do poder dos meios de comunicação. O vídeo, produzido por feministas e ativistas da justiça social, continha depoimentos acerca do mundo de hoje e da possibilidade de um futuro mais justo, com participação de José Saramago, Sami Nair, Gabriel García Marques, Manu Chao, entre outros. Com linguagem bastante simples, deixou a desejar apenas na ausência de legenda em português, os relatos traziam a reflexão do que seria o real terrorismo, além de fazer críticas alusivas e diretas à política de Bush, o 43º. Faz, inclusive, menção à invasão do Iraque, em 2003, não como política de combate ao terrorismo, mas como o próprio terrorismo, suscitando debates sobre o imperialismo e a pretensão norte-americana de dominar o mundo.
Após o documentário, que demorou para chegar ao fim, devido à falhas do DVD, fui a caminho da parada de ônibus, a fim de voltar logo para casa. Ainda em frente ao Quartel da Polícia Militar, no Derby, fomos (eu e Rafael) assaltados por três garotos com aparência de vinte anos de idade. Devido à abordagem cautelosa dos assaltantes, munidos apenas de bicicletas, cada qual na “sua” (bem provavelmente conseguida em situação de roubo), e à nossa distração, não havia possibilidade de escapar. Eles vieram por trás e nos cercaram na calçada da rua mediamente movimentada e ironicamente localizada em frente a um quartel. Não fizeram nada comigo, apenas seguraram Rafael pela camisa e com uma pancada na perna, deixaram-no imóvel e levaram seu celular. Os garotos não estavam interessados em dinheiro, fato que nos leva a crer que já fazem parte de uma “quadrilha” de roubo de celular. Ainda viram a carteira de Rafael e apalparam a minha bolsa, em busca de outro celular, mas não levaram mais nada, nem carteira nem bolsa. Em seguida, foram embora pedalando bicicletas como se nada tivesse ocorrido. Posteriormente, avistamos um policial, já um pouco distante do local do assalto, e fomos falar com ele, não na intenção de reaver o celular, claro; a intenção era, porém, de alertar a polícia para que haja maior segurança no local. O diálogo com “o fardado” foi responsável pela perda de qualquer esperança na polícia:

-Acabamos de ser assaltados em frente ao quartel do Derby
-Roubaram o que?
-O celular.
-Vocês estão com celular ai? Liguem para o 190 e comuniquem isso.

Se roubaram o celular, como poderíamos estar com ele?

*Programação da amostra: http://www.concepto.com.br/cclf/admin/modules/noticia/?id=324

sábado, 12 de janeiro de 2008

Garantia do fim da violência!?

Hoje, recebi um e-mail que comentava a reunião acorrida no Palácio das Princesas, a qual lançou oficialmente o Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania) em Pernambuco.O programa tem o objetivo de conseguir uma maior participação das prefeituras do Estado no combate à violência. A cerimônia contou com a presença do polêmico Newton Carneiro, prefeito de Jaboatão dos Guararapes, que expôs dois projetos acerca do tema. Um deles foi a criação de uma secretaria municipal de segurança. O outro, um cemitério exclusivo para bandidos. Havia, ainda, no e-mail, uma entrevista com o autor dos projetos, em que ele explicava a finalidade e importância do cemitério. Desconhecendo a alcunha de louco atribuída por muitos a Newton Carneiro, iludi-me ao pensar que leria não a solução, mas, ao menos, uma medida plausível a fim de realmente diminuir/acabar com a violência. No decorrer da leitura percebi que a intenção do prefeito não é reduzir a criminalidade do Estado, mas tão-somente diminuir os índices de violência em Jaboatão, através do desvio de crimes para as cidades vizinhas, numa atitude puramente eleitoreira. Os meios para alcançar tal meta são ainda mais medonhos, visto que a justificativa é, no mínimo, ingênua (“Bandido tem medo de cemitério, de caixão de defunto!”). Após algumas gargalhadas momentâneas, surgiu a séria preocupação com o futuro do país. Posteriormente, busquei informações a respeito do inusitado prefeito, sem grande dificuldades descobri que ele foi acusado pelo Ministério Público por IMPROBIDADE. Como o próprio Newton Carneiro diz em http://acertodecontas.blog.br/entrevistas/vou-derrotar-doutor-infraero-e-doutor-dancarina/ (vale a pena conferir), que o povo não entende o que é gay, fui em busca de uma explicação sucinta a respeito do termo jurídico (“Improbidade, regra geral, é toda ação ou omissão desonesta do empregado, que revelam desonestidade, abuso de confiança, fraude ou má-fé, visando a uma vantagem para si ou para outrem. Ex.: furto, adulteração de documentos pessoais ou pertencentes ao empregador, etc.”) para que ninguém deixe de entender a gravidade da acusação. Enfim, é com completa desconfiança na redução da violência e com tamanha perplexidade ao "conhecer" tal figura que deixo aqui a entrevista recebida por e-mail (*não tenho as fontes da entrevista, mas deixo claro que tal genialidade do cemitério não é segredo para ninguém.):
- O senhor quer fazer um cemitério?
NEWTON CARNEIRO - Um cemitério pra bandido. Um cemitério especial para sepultar unicamente bandidos e criminosos de toda a espécie.
- E por que um cemitério tão específico assim?
CARNEIRO - Jaboatão tem um milhão e duzentos mil habitantes. De algum tempo pra cá, a violência lá (Jaboatão) aumentou mais do que no Recife. Venho observando que de 30 dias pra cá houve um colapso na Segurança Pública no Grande Recife. Dá pra entender que está havendo uma greve clandestina subterrânea que o governador não sabe.
- E o senhor acha que esse cemitério vai ajudar?
CARNEIRO - Pelo menos espanta os bandidos de lá e eles vão atuar em Olinda, Paulista, no Recife, porque aqui os prefeitos não têm coragem de fazer isso.
- O senhor acha que os bandidos, ao saber que tem um cemitério para eles em Jaboatão, vão fugir?
CARNEIRO - Bandido tem medo de cemitério, de caixão de defunto! Nós vamos inovar um pouco. Vamos enterrar eles normal, horizontal, são 80 centímetros por dois metros. Vai ser enterrado num saco de pano!
- Num saco de pano?
CARNEIRO - Porque com um ano e meio depois nos recolhemos os ossos todinhos pra tocar fogo!"

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Na lama do meu quintal.

Vida de estudante é andar de ônibus mesmo, mas na minha situação atual, até esse transporte já virou luxo. Então estou tendo o prazer e, talvez, o risco de aproveitar mais o Recife, literalmente com os pés no chão. Essas caminhadas à noite, tarde da noite, pela cidade rendem um certo friozinho na barriga, mas servem para aproveitar melhor a beleza da cidade. Não estranhem se parecer piegas demais, estou ainda mais apaixonada pelo Recife. As aventuras nos bacuraus do Cais de Santa Rita têm sido bastante freqüentes; nem sempre, porém, é possível desfrutar de um ônibus, muitas vezes preciso andar da rua do Parque Treze de Maio até o "encontro dos bacuraus" na madrugada parada de Recife nos "dias de branco". Enfim, acho legal a trilha, inclusive tenho observado que a cidade anda com muito policiamento. O que, de fato, irrita são os amigos (bem intencionados, claro) mandando eu apressar os meus curtos passos. Domingo foi um dos melhores dias vividos nessa parte velha da cidade, que inclusive tem quase uma Champs-Elysées em frente ao famoso Bar Novo Pina, é bom salientar que todos riram muito de mim quando fiz este comentário ufanista ontem. Nas tardes de domingo, é possível encontrar pessoas de todas as partes da "pirâmide social" nas ruas do velho Recife, fato bastante curioso e notório que se tornou ainda mais curioso e notório no dia 6 de janeiro, um domingo. A escassez de dinheiro sempre me leva para a cidade velha na garantia de um programa legal e barato, nesse dia não foi diferente, a surpresa foi o enorme som do maracatu que ecoava de longe. Meus conterrâneos sabem o quão corriqueiro é ouvir o batuque do maracatu nessas ruas; nesse dia, porém, presenciei o som do melhor maracatu que já ouvi. A harmonia era tanta que emocionava ainda mais, cada batuque batia forte no meu coração. Sempre gostei desse som estrondoso, mas domingo ele lavou a minha alma de uma forma que eu pensava que não existia. E era lindo observar todos os estamentos da tal "pirâmide social" vangloriarem o mesmo som da mesma forma, dava a impressão que algo naquele lugar unia as pessoas, pobres e ricos divertiam-se a admirar e curtir a cultura pernambucana. Ontem, preferi ficar pelo Treze de Maio, próximo à Faculdade de Direito do Recife, que tem carimbo do Império e da República, a fim de garantir uma acústica melhor para conversar. A vitrola de ficha dava um aconchego melhor ao lugar, um pouco de Beatles e um pouco de Águas de Março regavam a discussão. Uma modesta exposição fotográfica acontecia no bar, uma das fotos era do majestoso "pau de Brennand", que trouxe o tema (belezas do) Recife à mesa. Uma amiga havia ido ver de perto o monumento no começo do dia de ontem e estava ainda mais fissurada nessa obra ou insulto, segundo a opinião de alguns. Eis que o "pau de Brennand" não queria sair das nossas bocas (risos), passamos bom tempo falando sobre ele, que segundo a constatação visual de um dos integrantes da mesa, está cada dia mais próximo do Marco Zero. A conversa não se restringiu apenas ao plano cultural, divagamos também sobre a política, discutindo o futuro da cidade, Estado e país. Palpitando acerca das próximas eleições e da conduta política de "famosos" vereadores numa discussão bastante produtiva. Depois da quase expulsão do bar, devido à hora, fomos em busca do nosso bacurau Dois Irmãos, percorrendo a pé a longa e admirável rua da Aurora. Ainda arriscamos tirar fotos próximo ao caranguejo gigante e ao lado do ilustríssimo João Cabral de Melo Neto, que sempre está sentado à beira do Rio Capibaribe, assim como Manuel Bandeira. Já próximo de casa, não resistimos ao imenso desejo de imitar os beatles na capa do Abbey Road, a penúltima obra da banda. Após chegar em casa, jogamos Master, numa partida engraçada, em que, inclusive, uma das perguntas era sobre The Beatles e que o Ringo do nosso grupo, que vive querendo ser Lennon, acertou, claro. E assim o dia amanheceu e quem é de ônibus, pegou ônibus e quem é de pé, andou a pé.